Ontem me apaixonei por três
mulheres. Uma de vinte e dois, uma de trinta e dois, e uma de quarenta e dois
anos de idade. Três seres maravilhosos com aspirações, sonhos e desejos
completamente diferentes e tão parecidos ao mesmo tempo. Elas tinham tanta
coisa em comum e tanto a passar uma para outra, que ao final da noite eu só
pensava num possível encontro das três. Tenho certeza que seriam melhores amigas
em poucos dias.
Saí cedo para correr na praia,
por volta das cinco e dez da manhã já estava me alongando em frente ao posto
dois. Fui em direção ao forte de Copacabana e quarenta minutos depois já estava
de volta. Normalmente volto direto ao apartamento, mas como o dia amanhecera
quente e havia gente chegando à praia, resolvi deixar meu celular com alguém
para que eu pudesse dar um mergulho.
Marcela estava sentada a poucos
metros da água e por estar vestida com a roupa da noite anterior, que para ela ainda
não havia terminado, me pareceu ser a pessoa ideal para ficar temporariamente
com a guarda do meu estimado aparelho. Pedi o favor balbuciando três palavras
quaisquer, ainda ofegante pela corrida que acabara de realizar, agradeci e me
atirei ao mar.
A temperatura da água estava
ideal para qualquer um que estivesse com o corpo tão quente quanto o meu.
Fiquei uns cinco minutos brincando com as ondas e pensando naquele sorriso
maravilhoso que a jovem me ofereceu ao indicar positivamente que atenderia o meu
pedido. Saí lentamente da água e retoricamente perguntei. Chegando ou saindo?
Ela sorriu novamente e começou a
falar sem parar da festa que havia acabado há poucos minutos, numa famosa
boate, ali do outro lado da Atlântica. Quando fui ver já estava sentado ao lado
dela gargalhando como se fossemos amigos a vida inteira. Falou que já era mãe
de um garotinho, mas que a avó morava com ela e lhe dava total auxílio e
cobertura para que ela pudesse concluir o curso, e que estava curtindo demais o
seu terceiro ano de faculdade, pois nos dois primeiros fez a besteira de
começar um namoro, no dia do seu trote, com um veterano do quinto período.
Enquanto ela falava de como
estava se sentindo livre e de como queria aproveitar cada segundo da sua vida
fazendo apenas o que tivesse vontade de fazer eu fui sendo levado, sem
perceber, aos meus tempos de UERJ, ao hall do sexto andar, ao Centro Acadêmico,
às tardes no teatro e às noites no bar. Quando fui perceber já estávamos no
meu quarto, completamente nus.
Por volta das nove da manhã a
deixei na Estação Cardeal Arco Verde e parti para o Centro. Com um enorme pesar
no meu peito, pois o meu desejo era passar o dia inteiro ouvindo as histórias,
as gargalhadas e sentindo o cheiro daquela criatura, mas era um dia que não poderia
faltar ao trabalho de jeito nenhum, pois tinha uma reunião marcada com a nova
gerente de RH da companhia.
Cheguei ao trabalho com um
sorriso indisfarçável no rosto, uma autoconfiança que só sente um homem de meia
idade após transar loucamente com uma jovem, vinte anos mais moça. Estava me
sentindo tão bem que contagiei a nossa nova gerente com toda aquela energia que
emanava de dentro de mim. Ao final da reunião convidei a nossa nova colega para
almoçar e fomos ao restaurante.
Marcela Aguiar estava no auge de
sua carreira, com apenas três anos de empresa já era gerente de um dos setores
mais importantes da companhia. Tinha dois filhos e um casamento mal das pernas
por conta da enorme atenção que ambos estavam dando à vida profissional, em
detrimento da pessoal. Conversamos sobre minha recente separação, sobre como
sofri, como passei por todo o processo, e quando dei por mim estávamos no final
de uma garrafa de vinho, que eu não sei em que momento surgiu, trocando beijos
e carícias ardentes ao fundo de um restaurante vazio no Centro da Cidade.
Despedimo-nos deixando aberta a possibilidade de outro encontro mais íntimo e
saímos em direções opostas. Ela de volta ao setor, pois ainda tinha coisas a
terminar, e eu, para o supermercado.
Teríamos um encontro do pessoal
da rua, uma galera que eu não via há vinte anos, exatamente o tempo em que
fiquei casado. Perdermos o contato, mas não o carinho e o amor que sentíamos
uns pelos outros. Então resolvi voltar àquele convívio e fique responsável por
comprar e gelar a cerveja da minha festa de reintegração ao grupo.
O evento começou por volta das
nove da noite e foi chegando gente que eu não via há muito tempo. Um negócio de
louco, até constrangedor, pois todo mundo começava a conversa com a mesma
frase. Lembra de mim? Eu não me lembrava da maioria, devido a minha conhecida
falta de memória e à concentração alcoólica que ia aumentando a cada hora. Mas
quando ela chegou, eu não tive dúvidas, hoje eu morro.
Ela me viu, mas não veio direto a
mim. Cumprimentou diversos amigos, abraçou, beijou, pegou uma caipirinha e se
enturmou. Eu continuei recebendo os abraços e à atenção que fora combinada um
mês antes, quando ainda estava desesperadamente precisando, mas de vez em
quando a procurava na multidão e deixava que ela me visse observando-a.
Era ela, o mesmo sorriso, a mesma
simpatia, a menina da rua de cima por quem fui completamente louco aos
dezessete anos de idade. Na época trocamos apenas algumas poucas palavras, pois
ela estava de casamento marcado e com um filhinho de um ano de idade. Mas foi o
suficiente para que eu me encantasse para todo o sempre. E com o passar da
noite todo aquele sentimento foi voltando à tona, devido ao dia maravilhoso que
o acaso estava me proporcionando e também aos seis copos de Campari com soda
que já havia colocado para dentro junto com um montão de cerveja.
Por volta da meia noite, quando o
DJ soltou Tim Maia, só vi um vulto correndo, passando por mim e se atirando na
piscina. Livrei-me de algumas pessoas à minha frente para poder ver quem era o
louco e não acreditei. Não pensei duas vezes, tirei minha carteira e celular
dos bolsos e me joguei também. Pensando, é claro, que seria uma cena daquelas
de filme, onde o primeiro cai e todo mundo vem atrás, mas não, quando emergi
todos ainda estavam dançando e apenas nós dois dentro d’água.
Ela veio em minha direção e falou
já me abraçando, que havia acabado de se divorciar e que sempre pensou em mim,
nos beijamos por uns quinze minutos. Acho que foi isso, pois quando saímos da
piscina, Tim Maia já havia se retirado do palco e já estávamos ouvindo Zéca
Pagodinho. A festa terminaria em samba, como não podia deixar de ser, mas a
minha noite estava apenas começando.
Não sou desses homens que medem o
seu valor e a sua masculinidade pela quantidade de mulheres que consegue
conquistar, mas não posso negar que estava em estado de graça por esse dia
incrível que parecia não querer terminar.
Quando descemos os convidados já
haviam partido, apenas Marquinhos e Dudu permaneciam na sala, sentados no sofá
com os olhos fechados e uma garrafa de uísque entre eles. E o Jorge, dono da
casa e organizador deste encontro, recolhendo algumas coisas que poderiam
estragar se ficassem fora da geladeira.
Beijávamo-nos mais uma vez quando
o aplicativo alertou que o seu taxi já havia chegado. Levei-a até o portão, nos
despedimos e voltei correndo. Peguei uma cerveja no freezer, dois copos e
chamei meu velho amigo para a saideira. Contei tudo o que havia acontecido
comigo desde cedo, que este estava sendo o melhor dia da minha vida, que estava
perdidamente apaixonado por três mulheres separadas por uma década de distância
entre elas. E que dessa última eu nem fazia a menor ideia do nome.
Quando ele falou, Marcelinha, eu
gelei. Fiquei sem palavras, sem ação, pensando na peça que o destino estava me
pregando. Eu já havia notado a coincidência durante o almoço, mas não estranhei
porque o nome da Marcela Aguiar já estava há mais de duas semanas na minha
agenda. Mas agora era demais, não podia ser sério isso.
Jorginho voltou a arrumar a casa
enquanto eu fiquei sentado à mesa relembrando tudo o que cada uma havia me
contado. Todas as intimidades, segredos, anseios e desejos; e em como tudo se
alinhavava numa enorme colcha de retalhos que poderia perfeitamente ter sido
retalhada somente depois de produzida, de tão uniforme que parecia.
Agora, pensando melhor, e já sem
o efeito do álcool e da ressaca que me fizeram acreditar estar apaixonado por
três mulheres diferentes, percebo que na verdade, de alguma forma, consegui
acessar dois outros planos paralelos e me encantar por Marcela em três momentos
diferentes de sua vida. Mas de uma coisa eu não tenho a menor dúvida. As três
certamente deviam se encontrar. Como a jovem Marcela encantaria a já
divorciada, e como esta última faria tão bem à balzaquiana gerente de RH.
Eu fico por aqui, como qualquer homem aos seus quarenta e dois anos de idade, que passasse por esta loucura, ficaria. Inspirado pela juventude inconsequente da minha contemporânea, motivado pela garra incansável da colega de trabalho, e surpreso com o foco e a maturidade da nossa jovem sonhadora. Simplesmente apaixonado por todas.
Eu fico por aqui, como qualquer homem aos seus quarenta e dois anos de idade, que passasse por esta loucura, ficaria. Inspirado pela juventude inconsequente da minha contemporânea, motivado pela garra incansável da colega de trabalho, e surpreso com o foco e a maturidade da nossa jovem sonhadora. Simplesmente apaixonado por todas.
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