sexta-feira, 15 de maio de 2015

APAIXONADO POR TODAS


Ontem me apaixonei por três mulheres. Uma de vinte e dois, uma de trinta e dois, e uma de quarenta e dois anos de idade. Três seres maravilhosos com aspirações, sonhos e desejos completamente diferentes e tão parecidos ao mesmo tempo. Elas tinham tanta coisa em comum e tanto a passar uma para outra, que ao final da noite eu só pensava num possível encontro das três. Tenho certeza que seriam melhores amigas em poucos dias.

Saí cedo para correr na praia, por volta das cinco e dez da manhã já estava me alongando em frente ao posto dois. Fui em direção ao forte de Copacabana e quarenta minutos depois já estava de volta. Normalmente volto direto ao apartamento, mas como o dia amanhecera quente e havia gente chegando à praia, resolvi deixar meu celular com alguém para que eu pudesse dar um mergulho.

Marcela estava sentada a poucos metros da água e por estar vestida com a roupa da noite anterior, que para ela ainda não havia terminado, me pareceu ser a pessoa ideal para ficar temporariamente com a guarda do meu estimado aparelho. Pedi o favor balbuciando três palavras quaisquer, ainda ofegante pela corrida que acabara de realizar, agradeci e me atirei ao mar.

A temperatura da água estava ideal para qualquer um que estivesse com o corpo tão quente quanto o meu. Fiquei uns cinco minutos brincando com as ondas e pensando naquele sorriso maravilhoso que a jovem me ofereceu ao indicar positivamente que atenderia o meu pedido. Saí lentamente da água e retoricamente perguntei. Chegando ou saindo?

Ela sorriu novamente e começou a falar sem parar da festa que havia acabado há poucos minutos, numa famosa boate, ali do outro lado da Atlântica. Quando fui ver já estava sentado ao lado dela gargalhando como se fossemos amigos a vida inteira. Falou que já era mãe de um garotinho, mas que a avó morava com ela e lhe dava total auxílio e cobertura para que ela pudesse concluir o curso, e que estava curtindo demais o seu terceiro ano de faculdade, pois nos dois primeiros fez a besteira de começar um namoro, no dia do seu trote, com um veterano do quinto período.

Enquanto ela falava de como estava se sentindo livre e de como queria aproveitar cada segundo da sua vida fazendo apenas o que tivesse vontade de fazer eu fui sendo levado, sem perceber, aos meus tempos de UERJ, ao hall do sexto andar, ao Centro Acadêmico, às tardes no teatro e às noites no bar. Quando fui perceber já estávamos no meu quarto, completamente nus.

Por volta das nove da manhã a deixei na Estação Cardeal Arco Verde e parti para o Centro. Com um enorme pesar no meu peito, pois o meu desejo era passar o dia inteiro ouvindo as histórias, as gargalhadas e sentindo o cheiro daquela criatura, mas era um dia que não poderia faltar ao trabalho de jeito nenhum, pois tinha uma reunião marcada com a nova gerente de RH da companhia.

Cheguei ao trabalho com um sorriso indisfarçável no rosto, uma autoconfiança que só sente um homem de meia idade após transar loucamente com uma jovem, vinte anos mais moça. Estava me sentindo tão bem que contagiei a nossa nova gerente com toda aquela energia que emanava de dentro de mim. Ao final da reunião convidei a nossa nova colega para almoçar e fomos ao restaurante.

Marcela Aguiar estava no auge de sua carreira, com apenas três anos de empresa já era gerente de um dos setores mais importantes da companhia. Tinha dois filhos e um casamento mal das pernas por conta da enorme atenção que ambos estavam dando à vida profissional, em detrimento da pessoal. Conversamos sobre minha recente separação, sobre como sofri, como passei por todo o processo, e quando dei por mim estávamos no final de uma garrafa de vinho, que eu não sei em que momento surgiu, trocando beijos e carícias ardentes ao fundo de um restaurante vazio no Centro da Cidade. Despedimo-nos deixando aberta a possibilidade de outro encontro mais íntimo e saímos em direções opostas. Ela de volta ao setor, pois ainda tinha coisas a terminar, e eu, para o supermercado.

Teríamos um encontro do pessoal da rua, uma galera que eu não via há vinte anos, exatamente o tempo em que fiquei casado. Perdermos o contato, mas não o carinho e o amor que sentíamos uns pelos outros. Então resolvi voltar àquele convívio e fique responsável por comprar e gelar a cerveja da minha festa de reintegração ao grupo.

O evento começou por volta das nove da noite e foi chegando gente que eu não via há muito tempo. Um negócio de louco, até constrangedor, pois todo mundo começava a conversa com a mesma frase. Lembra de mim? Eu não me lembrava da maioria, devido a minha conhecida falta de memória e à concentração alcoólica que ia aumentando a cada hora. Mas quando ela chegou, eu não tive dúvidas, hoje eu morro.

Ela me viu, mas não veio direto a mim. Cumprimentou diversos amigos, abraçou, beijou, pegou uma caipirinha e se enturmou. Eu continuei recebendo os abraços e à atenção que fora combinada um mês antes, quando ainda estava desesperadamente precisando, mas de vez em quando a procurava na multidão e deixava que ela me visse observando-a.

Era ela, o mesmo sorriso, a mesma simpatia, a menina da rua de cima por quem fui completamente louco aos dezessete anos de idade. Na época trocamos apenas algumas poucas palavras, pois ela estava de casamento marcado e com um filhinho de um ano de idade. Mas foi o suficiente para que eu me encantasse para todo o sempre. E com o passar da noite todo aquele sentimento foi voltando à tona, devido ao dia maravilhoso que o acaso estava me proporcionando e também aos seis copos de Campari com soda que já havia colocado para dentro junto com um montão de cerveja.

Por volta da meia noite, quando o DJ soltou Tim Maia, só vi um vulto correndo, passando por mim e se atirando na piscina. Livrei-me de algumas pessoas à minha frente para poder ver quem era o louco e não acreditei. Não pensei duas vezes, tirei minha carteira e celular dos bolsos e me joguei também. Pensando, é claro, que seria uma cena daquelas de filme, onde o primeiro cai e todo mundo vem atrás, mas não, quando emergi todos ainda estavam dançando e apenas nós dois dentro d’água.

Ela veio em minha direção e falou já me abraçando, que havia acabado de se divorciar e que sempre pensou em mim, nos beijamos por uns quinze minutos. Acho que foi isso, pois quando saímos da piscina, Tim Maia já havia se retirado do palco e já estávamos ouvindo Zéca Pagodinho. A festa terminaria em samba, como não podia deixar de ser, mas a minha noite estava apenas começando.

Não sou desses homens que medem o seu valor e a sua masculinidade pela quantidade de mulheres que consegue conquistar, mas não posso negar que estava em estado de graça por esse dia incrível que parecia não querer terminar.

Quando descemos os convidados já haviam partido, apenas Marquinhos e Dudu permaneciam na sala, sentados no sofá com os olhos fechados e uma garrafa de uísque entre eles. E o Jorge, dono da casa e organizador deste encontro, recolhendo algumas coisas que poderiam estragar se ficassem fora da geladeira.

Beijávamo-nos mais uma vez quando o aplicativo alertou que o seu taxi já havia chegado. Levei-a até o portão, nos despedimos e voltei correndo. Peguei uma cerveja no freezer, dois copos e chamei meu velho amigo para a saideira. Contei tudo o que havia acontecido comigo desde cedo, que este estava sendo o melhor dia da minha vida, que estava perdidamente apaixonado por três mulheres separadas por uma década de distância entre elas. E que dessa última eu nem fazia a menor ideia do nome.

Quando ele falou, Marcelinha, eu gelei. Fiquei sem palavras, sem ação, pensando na peça que o destino estava me pregando. Eu já havia notado a coincidência durante o almoço, mas não estranhei porque o nome da Marcela Aguiar já estava há mais de duas semanas na minha agenda. Mas agora era demais, não podia ser sério isso.

Jorginho voltou a arrumar a casa enquanto eu fiquei sentado à mesa relembrando tudo o que cada uma havia me contado. Todas as intimidades, segredos, anseios e desejos; e em como tudo se alinhavava numa enorme colcha de retalhos que poderia perfeitamente ter sido retalhada somente depois de produzida, de tão uniforme que parecia.

Agora, pensando melhor, e já sem o efeito do álcool e da ressaca que me fizeram acreditar estar apaixonado por três mulheres diferentes, percebo que na verdade, de alguma forma, consegui acessar dois outros planos paralelos e me encantar por Marcela em três momentos diferentes de sua vida. Mas de uma coisa eu não tenho a menor dúvida. As três certamente deviam se encontrar. Como a jovem Marcela encantaria a já divorciada, e como esta última faria tão bem à balzaquiana gerente de RH.

Eu fico por aqui, como qualquer homem aos seus quarenta e dois anos de idade, que passasse por esta loucura, ficaria. Inspirado pela juventude inconsequente da minha contemporânea, motivado pela garra incansável da colega de trabalho, e surpreso com o foco e a maturidade da nossa jovem sonhadora. Simplesmente apaixonado por todas.


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